terça-feira, janeiro 31, 2006

Campeonato do Mundo - Uruguai 1930

Vencedor: Uruguai
Vice: Argentina
Melhor marcador: Stabile, Argentina, 8 golos
Golos: 70 (3,89 por jogo)
Assistência: 434.500 (24.138,89 por jogo)



Em 21 de Maio de 1904, eram dados os primeiros passos para uma competição à escala mundial, com a criação da Federação Internacional de Futebol (FIFA - Fédération Internationale de Football Association), pela ideia original de Robert Guérin, C. A. W. Hirschman, Henry Delaunay e Jules Rimet; dois dias depois o primeiro congresso seria realizado, com a participação da França (Union des Sociétés Françaises de Sports Athlétiques, USFSA), Bélgica (Union Belge des Sociétés de Sports, UBSSA), Dinamarca (Dansk Boldspil Union, DBU), Holanda (Nederlandsche Voetbal Bond, NVB), Espanha (Madrid Football Club), Suécia (Svenska Bollspells Förbundet, SBF) e Suiça (Association Suisse de Football, ASF). Com Robert Guérin, e depois com Daniel Burley Woolfall, a Federação sairia da Europa continental.
Com Jules Rimet a presidente da FIFA (1921-1954), seriam dados os passos decisivos para a criação do Mundial. Sobre a influência, dos Jogos Olímpicos de Paris de 1924, é criada em 1926 uma comissão para estudar a possível realização do Campeonato do Mundo. «O conceito do Campeonato do Mundo nasce em França!»

O Uruguai, motivado pelas vitórias nos Jogos Olímpicos de 1924 e 28 oferece-se para organizar o Campeonato do Mundo, prontificando-se para pagar as despesas e a criar um estádio (o Centenario, alusivo ao 100 anos de Independência do país), esta proposta é acolhida com entusiasmo por Jules Rimet e ratificada no Congresso da FIFA de Barcelona em 18 de Maio de 1929.

Jules Rimet, a 21 de Julho de 1930 embarca em Villefranche Sur Mer, num navio italiano, Conte Verde, rumo a Montevideu. Segundo as crónicas, abandona o porto gritando: «Vive la France!» levando consigo, numa caixa, o troféu que seria dado ao vencedor, a Taça «Victoire aux Ailes d'Or» - mais conhecida como Taça Jules Rimet – onde está projectada, como o nome indica, Vitória com os braços erguidos, esculpida por Abel Lafleur, ourives e futebolista amador.


Victoire aux Ailes d'Or - De 35 cm de altura e pesava aproximadamente 3,8 kg

No mesmo barco, o Conte Verde, estavam abarcadas as selecções nacionais da França, Bélgica (que o apanharia em Barcelona) e Roménia, já a Jugoslávia viajou no transatlântico, Florida. Numa Europa que vivia em plena crise económica, só iriam 4 selecções ao Mundial, devido aos custos até Montevideu e à arrogância isolacionista inglesa, fazendo-se notar, além da Inglaterra, a ausência da Alemanha, Áustria, Espanha, Itália, Hungria e Suiça.

Começava, com 13 selecções, o Mundial e surgiam mais dois problema – o primeiro bem mais actual – os clubes não viam com bons olhos ceder os jogadores durante dois meses às selecções nacionais, a principal figura era a França, onde o profissionalismo já se iniciava, dando origem à não ida de Manuel Anatol, um dos melhores jogadores franceses e do Racing Club; o segundo era com a selecção brasileira, que se viu arredada de alguns dos seus principais jogadores – de origem paulista –, devido ao diferendo com a Associação Paulista de Esportes e Atléticos por ter recusado a incluir um treinador de São Paulo na equipa técnica.


Cartaz do Mundial do Uruguai de 1930

A honra de serem as primeiras selecções a jogarem o Campeonato do Mundo, caberia à França e ao México, o jogo ficaria 4-1 a favor dos franceses, o primeiro golo em campeonatos do Mundo seria marcado pelo francês Lucien Laurent.
Um dos dois jogos mais recordados deste Mundial seria outro da França, opondo-se, desta vez à Argentina, uma selecção desfalcada contra os vice-campeões olímpicos. Contra as expectativas, mas deixando os adeptos uruguaios em júbilo, a França fez uma melhor primeira parte. A vitória Argentina não iria ser tão fácil como parecia! A segunda parte é de parada e resposta, a Argentina obriga o guarda-redes Alex Thepot um conjunto de boas defesas, mas só chegaria ao golo de penalty – convertido por Luis Monti – aos 81 minutos. Aos 85 minutos, o árbitro brasileiro, Gilberto de Almeida Rego, decide entrar em jogo, ou melhor decide acabar o jogo, o que levaria a uma invasão de campo e aos protestos dos jogadores franceses e dos adeptos. Só quando alguns jogadores se preparavam para se irem embora é que o árbitro se apercebe de erro, retomando o jogo e fazendo jogar os cinco minutos restantes.


Andrade, a Maravilha Negra, considerado por muitos o melhor jogador do torneio.

O outro grande jogo seria o da final, como previsto antes do início da edição, chegariam a esta fase o Uruguai e a Argentina, «a final de Amesterdão (Jogos Olímpicos de 1928) estava reeditada». A rivalidade fez-se sentir logo nos dias anteriores, a federação uruguaia só disponibilizaria 10 mil bilhetes para o território argentino, contra os 30 mil vendido no Uruguai. Muitos argentinos viriam de barco (a partir do rio de Mar del Plata) e teriam que esperar horas até puderem entrar em solo uruguaio.
A Argentina que chegaria à final derrotando a França (1-0), o México (6-3) e o Chile (3-1), na primeira fase, e os EUA, do jogador de família portuguesa Adelino Gonsalves, por 6-1, nas meias-finais. Depositava maior confiança no seu defesa Juan Evaristo, nos médios Peucelle e Monti e nos avançados Stabile e Ferreyra. Monti era a grande estrela da equipa, dotado tecnicamente era capaz das jogadas mais sublimes juntando a isso a impetuosidade que dava às disputas defensivas, autor de tackles imponentes e Stabile, que seria o melhor marcador do torneio, com 8 golos, não era um avançado puro, jogava entre zonas, conhecido como El Filtrador, por penetrar com facilidade nas defesas adversárias, facto curioso, é que Stabile não estava para jogar no primeiro jogo do Mundial, entrou devido a uma crise nervosa Roberto Cherro. A Argentina entraria com Botasso; Della Torre, Paternoster, Juan Evaristo; Monti, Suarez, Peucelle; Varrallo, Stabile, Ferreyra (capitão) e Mário Evaristo, treinados por Francisco Olazar.
O Uruguai para aqui estar presente eliminaria o Peru (1-0) e a Roménia (4-0), na primeira fase, e a Jugoslávia, por 6-1, nas meias-finais, a equipa Celeste apresentava-se neste final como bi-campeã olímpica, mas com a sua grande base envelhecida; Nasazzi, Scarone, Cea e Andrade já não revelavam a frescura física de outros tempos. Mesmo assim esta selecção mostrava-se evoluída para o seu tempo, apesar do seu 2-3-5 revelava já alguma sagacidade táctica, treinados por Alberto Supicci, que pouco ou nenhuma influencia tinha nas noções tácticas e na constituição da equipa - as suas funções limitavam-se à preparação física -, essas tarefas ficariam para o capitão Nasazzi, que criara uma equipa compacta, que utilizava a sua grande segurança defensiva como a arma da ataque, explorando fortes contra-ataques surpreendendo os adversários. José Nasazzia, era um defesa intransponível considerado por muitos, um dos primeiros liberos da história do futebol; Scarone, era um cabeceador exímio, conhecido pela enorme precisão do passe e pelo Mago; Pedro Cea, era um jogador lento, mas em contrapartida habilidoso, que com a técnica prodigiosa do seu pé esquerdo marcaria ao longo das três competições (24, 28 e 30) golos bastante decisivos, tornando-se o vice-goleador do torneio; e José Leandro Andrade, era a Maravilha Negra, era uma das principais estrelas deste mundial e exemplificador da mistificação da cultura e selecção uruguaia tinha sido um dos primeiros jogadores negros a jogar nos relvados europeus, no Jogos Olímpicos de Paris de 1924, era um jogador que defendia com grande capacidade e quando tinha a bola nas sua posse dava maior elegância ao jogo subindo pelo seu flanco. A equipa uruguaia entraria com Ballesteros, que ingressara no onze do mundial para substituir o guarda-redes Mazzali (um dos herois dos Jogos Olímpicos de 24 e 28), que tinha sido expulso, após ter sido apanhado a altas horas da noite a beber; Nasazzi (capitão), Mascheroni; Andrade, Fernandez, Gestido; Dorado, Scarone, Castro, Cea e Iriarte.
O jogo começava em polémica, os jogadores argentinos e uruguaios queriam jogar com as bolas fabricadas nos seus países, o árbitro belga John Langenus decidiu de forma salomónica na primeira parte os argentinos jogariam com a sua bola e na segunda com a dos uruguaios, coincidentemente cada uma das equipas venceria os 45 minutos relativos à sua bola. Perante 90 mil espectadores, o Uruguai entra no ataque e faz logo aos 12 minutos o 1-0, aproveitando um espaço concedido na área gaúcha, Pablo Dorado faz o golo, para euforia dos seus adeptos. Mesmo assim equipa do Uruguai mostra-se algo nervosa, falhando sucessivos passes, deixando o jogo para a Argentina, que aos 20 minutos cala o Estádio do Centenário, por Peucelle e aos 37 gela-o por completo quando Stabile, faz o seu 8º golo na competição, perante os protestos enraivecidos do capitão uruguaio, Nasazzi, reclamando um fora-de-jogo. O árbitro dá como terminada a primeira parte, Nasazzi regressa aos balneários enfurecido, «algo deve ter dito, porque algo mudou!»
Começa o segundo tempo, para Nasazzi era importante dar o exemplo, marca o golo do empate, mas não (!), ele é anulado, pelo árbitro belga! Esse golo não tardia a aparecer, estamos perante outra equipa uruguaia esta reaviva o seu espírito lutador de 2 e 6 anos antes, a classe é que, infelizmente, já não é a mesma, outra vez aos 12 minutos, desta vez da segunda parte, o Uruguai marcaria um tento, o 2-2, por Pedro Cea! Os adeptos uruguaios animam-se, outra vez, o silêncio é quebrado, para pena dos jogadores argentinos, que não mereciam aquele ambiente. Aos 68 minutos, Iriarte, após uma jogada espectacular da equipa Celeste, distancia o Uruguai a um golo. Perante este sentimento de injustiça, a Argentina tenta reagir, parte para cima da área contrária, atira-se para cima dos jogadores uruguaios, mas sem êxito! Perante este cenário, o Uruguai faz o 4-2, nos últimos segundos, por Hector Castro, jogador de um só braço, marcaria o último golo do Mundial de 1930 (!), que finalizaria o jogo. O troféu é entregue nas mãos do capitão uruguaio, Nasazzi – «O Uruguai é o primeiro campeão do Mundo!»
Era o delírio nas ruas de todo o Uruguai, o dia seguinte, para compensar os festejos, é decretado feriado nacional. Era o último acto de uma grande geração uruguaia, que tinha como representantes das três vitórias Nasazzi, Scarone, Andrade e Cea.
O Campeonato do Mundo estava lançado, o sucesso fora atingido financeira, desportiva e culturalmente, para grande gáudio dos adeptos do futebol começava a campanha dos Campeonatos do Mundo!



Celebração, pela vitória no Campeonato do Mundo, dos jogadores Celestes.

Primeira-Fase



Fase de Eliminatórias



Ficha da Final:
http://2002.fifaworldcup.yahoo.com/02/en/pf/h/pwc/mr/1087.html

Dream Team



Pontos curiosos:
  • Na Roménia quem convoca é rei, ou o contrário! O rei exerceu as funções de treinador, acrescentado a isso um decreto, onde seria outorgado aos jogadores seleccionados três meses de licença nos seus respectivos trabalhos;
  • A selecção brasileira não foi completa ao Mundial, sendo constituída apenas por jogadores cariocas, devido a uma divergência com a Federação Paulista, onde esta exigia a inclusão de um treinador de São Paulo na equipa técnica;
  • Só dois países fundadores da FIFA é que entrariam neste torneio;
  • Lucian Laurent, jogador francês, tornou-se o primeiro jogador a marcar um golo numa fase final do Mundial;
  • A Bolívia no seu jogo de estreia decidiu agradeceu ao país organizador. Cada jogador entraria em campo com uma camisola com uma letra, que faria a mensagem: «Viva Uruguay». Pois, mas o jogador responsável pelo terceiro «U» esqueceu-se de apareceu, dando um resultado interessante;
  • Como símbolo do amadorismo da organização esta o seu cartaz oficial, quando os jogos começavam a 13 e acabam 30 Julho, o cartaz anunciava o começo para 15 de Julho e o fecho para 15 de Agosto;
  • O argentino Guillermo Stabille, foi o primeiro jogador que conseguir um hat-trick num torneio do Campeonato do Mundo;
  • O primeiro jogador a ser expulso num Mundial seria o defesa peruano De Las Casas, devido a ter empurrado o árbitro chileno Alberto Warken, durante o jogo Peru-Roménia (1-3), aliás foi a única expulsão no Uruguai;
  • O árbitro belga, John Langenus, teve que resolver difícil na final. Uruguaios e argentinos queriam jogar com as bolas fabricas nos seus países, o árbitro decidiu que uma entraria na primeira parte e outra na segunda. Através de moeda ao ar, ficou decidido que seriam os argentinos os primeiros;
  • O árbitro brasileiro, Gilberto de Almeida Rego, decidiu que o jogo entre a França e a Argentina (0-1) devia de acabar mais cedo, foi o que fez! Acabou o jogo 5 minutos mais cedo, rezam as crónicas que quando o árbitro se deu conta de erro, já alguns jogadores argentinos estavam no chuveiro;
  • Este foi o único Campeonato do Mundo, sem a disputa de 3º e 4º lugar;
  • O torneio concentrou-se numa única cidade, em Montevideu, com os seus três estádios – Centenario, Pocitos e Parque Central.

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